domingo, dezembro 29, 2024

SOBRAL - OS CINCO FATORES QUE LEVARAM O SARCÁSTICO IVO A SER DERROTADO PELO EXCÊNTRICO OSCAR

Desde a vitória de Cid Ferreira Gomes em 1996 o seu grupo político comanda a cidade de Sobral. Nesse percurso, Cid se empoderou como Governador e depois Senador, ao mesmo tempo que manteve o controle da cidade através das eleições dos aliados Leônidas Cristino, Veveu Arruda e do irmão Ivo Gomes. Excetuando a eleição de 2012, quando o quase desconhecido Dr. Guimarães por pouco não venceu o não empolgante Veveu, as demais eleições foram tranquilas para os FGs. Mas foi nesse épico ano de 2024 que o ciclo de comando do clã Ferreira Gomes chega ao fim com a derrota de sua candidata Izolda Cela (PSB) para o Deputado Estadual Oscar Rodrigues (União Brasil).

Desde 2016, com a candidatura de Moses Rodrigues à prefeito, que os "Rodrigues das Faculdades Inta" tentam tirar os Ferreira Gomes do poder em Sobral. Na eleição de 2020, Oscar foi derrotado por Ivo - que era candidato a reeleição - pelo placar de 66.519 a 45.795 votos, ou seja, com uma sonora maioria de 18,5% naquela ocasião. Mas o que houve nesse ano de 2024 para que essa hegemonia eleitoral do então grupo situacionista virasse pó? Na exata matemática eleitoral para onde foram os mais de 20.000 votos de maioria de 2020? Qual o cenário encontrado por Oscar Rodrigues para sair de 45 mil para os significativos 65 mil votos?

Após ouvir várias lideranças e atores políticos dessa histórica eleição, o Blog chega a conclusão que a vitória de Oscar não se deve em peso ao seu poder econômico e a sua resiliência política, muito menos a sua proposta de governo que nem se quer foi bem conhecida. O professor e empresário educacional venceu por que encontrou uma série de variáveis políticas específicas nesse 2024 que se entrelaçaram, sobretudo em meio a desorganizada e até soberba coordenação de campanha de Izolda e de seus padrinhos Cid e Ivo Gomes. 

Certamente um dos maiores méritos de Oscar, uma figura destemida e excêntrica no meio político, foi manter unida a oposição agregando experientes lideranças, evitando assim brechas para a tão manjada estratégia de Cid em dividir a oposição alimentando uma segunda candidatura como assim fez em 2012 e 2016. 

As variáveis políticas dessa eleição de 2024 - as quais chamaremos de FATORES - em consonância potencializaram uma a outra. Em uma eleição com resultado apertado é inegável que todos esses pontos aqui relacionados tiveram peso decisivo nos números finais. 

Fator 1: IVO GOMES, O CABO ELEITORAL AS AVESSAS
Ele, indiscutivelmente, está muito longe de ter feito uma gestão ruim. Os oito anos de Ivo deixam um legado quase irretocável em infraestrutura, educação, saúde e vários programas sociais e de inclusão. 

Mas onde está o erro? Na pessoa dele como político, ou seja, na sua maneira de impor suas vontades sempre em linha de confronto aberto. 

Suas tomadas de decisões, claramente não pesadas por ele devido a uma certa mescla de soberba com autoconfiança eleitoral, tiveram peso nas urnas. Do confronto com a Igreja Católica na encampação da Santa Casa pela Prefeitura, passando pela falta de diálogo com setores empresariais da cidade e chegando até o acaso com a desativação do popular Guarany de Sobral, Ivo foi criando obstáculos para a vitória de um sucessor no seu grupo partidário. Os seus asseclas não o lembraram que a terra de Dom José Tupinambá da Frota tem um largo núcleo social conservador, cristão, tradicional e que torce o nariz até quando as faixas de pedestre da cidade são pintadas com as cores do arco-íris. 

O carisma de Ivo é uma faca de dois gumes e seu marcante sarcasmo passa muitas das vezes do tom e soa como prepotência. Um episódio bastante representativo foi quando em uma entrevista radiofônica ao ser perguntado sobre o seu principal opositor, disse: "O Oscar é doido! Olha só o cabelo dele".  

Daí, nesse início de 2024, veio o erro primário: A Taxa do Lixo imposta pela Prefeitura. Medida extremamente impopular e atrelada a conta de água do SAAE. Ivo conseguiu uma faceta histórica: entrar na casa de todos os eleitores sobralenses e de maneira negativa. O estrago foi tão grande que a candidata Izolda passou praticamente toda a campanha prometendo rever essa cobrança com novos critérios, desconstruindo a narrativa de irreversibilidade do tributo outrora defendida por seu padrinho político.  

Fator 2 : O CANSAÇO DO ELEITOR COM OS FERREIRA GOMES
Embora esse fator já fosse existente quando consideramos que ele já se fizera presente em menor grau nas eleições anteriores, percebe-se que o desejo de mudança estava mais forte esse ano em seguimentos da sociedade sobralense que antes eram mais complacentes com o continuísmo dos irmãos Gomes. Esse gatilho do cansaço foi disparado pela postura do prefeito (fator 01) e pela escolha da sua candidata (fator 3). Ademais, os filhos do Dr. José Euclides não saem do repetitivo esquema: Cid-Leônidas-Veveu-Ivo-Izolda (Veveu)

A ciência política não é algo exato, mas percebe-se que o cenário nacional para novas experiências estava forte em cidades de médio e grande porte como fora o caso da quase vitória do jovem André Fernandes em Fortaleza. As decisivas redes sociais impulsionam as propostas de mudanças pelo "novo", diferente do discurso de "continuidade" que sempre é dificultoso devido o seu telhado de vidro. Em Sobral, uma nova geração de eleitores foi surgindo e sem uma memória atrelada as realizações administrativas das gestões com e pós Cid, sentiu-se bem a vontade em flertar com a experimentação de uma mudança de comando na cidade.  

Um componente a ser aqui colocado na mesa é o racha dos irmãos. Desde 2022, Ciro Gomes, visto por muitos como um cacifador de eleições em Sobral, está rompido com os irmãos e se manteve bem distante da acirrada sucessão do seu ninho político. O racha dos irmãos é sim um componente de fragilidade política percebido pelos eleitores.

Fator 3: AS LIMITAÇÕS DA CANDIDATA
A ex-governadora Izolda, indiscutivelmente, é uma referência na educação cearense, porém pagou um preço alto em vir para uma eleição que lhe exigia uma inexistente expertise sua para o corpo a corpo interiorano com seus clientelismos. A professora tem um perfil técnico, ou seja, de gabinete e não é uma política de grande apelo popular. As limitações eleitorais dela também ficaram atreladas a uma espécie de reedição da discreta gestão do seu marido Veveu Arruda na Prefeitura sobralense. 

Cela ficou com um discurso restrito e não criou uma identidade nova para cativar os eleitores indecisos e vulneráveis do seu partido, pois também não poderia se confrontar com aquilo que desabonava a gestão Ivo Gomes. O fato positivo de ser uma mulher com possibilidades de chegar pela primeira vez ao comando da Prefeitura de Sobral, acabou sendo ofuscado pela polêmica Taxa do Lixo. 

Faltou à ela mais tempo de campanha pois a estratégia dos FGs de apresentar seu candidato de última hora, dessa vez, dificultou a campanha eleitoral da educadora que há muito estava desconectada do cotidiano sobralense. 

Fator 4: O PT COM SEU VICE QUE NÃO SOMOU AO GRUPO
Era articulado que o Vice de Izolda fosse alguém do ramo empresarial que ajudasse no diálogo com a classe comercial e, principalmente, com a estrutura econômica para a campanha competitiva que se desenhava. Mas aí veio a ordem da cúpula estadual do PT de que não abria mão de continuar com a indicação do Vice na chapa. 

Para evitar uma dupla puramente feminina, a Vice Prefeita Cristiane Coleho  foi sacada da tentativa de reeleição e seu colega de partido, o discreto professor Paulo Flor, foi colocado para ser o companheiro de urna da candidata do PSB. 

Dizem os próximos aos caciques Cid e Ivo que estes deixam transparecer que o PT de Sobral é um peso morto. Eles aturam a sigla vermelha - a qual em Sobral é muito limitada eleitoralmente, comandada por sindicalistas da área educacional, sem lideranças carismáticas e acomodada em cargos da Prefeitura - por causa da necessidade de alinhamento com o poderoso partido que controla o governo estadual e federal. O Prefeito Cid chegou até a protagonizar uma querela com Cristiane, ao exonerar funcionários ligados a vice e a não renovar o aluguel do seu gabinete. Ninguém do partido e nem a própria vice teve personalidade para bater de frente com Ivo Gomes. 

Abertas as urnas na noite do dia 6 de outubro, percebeu-se que o PT e Paulo Flor não fizeram a diferença na votação e na reversão da derrota de Cela. 



Fator 5: O JOGO (QUASE) DUPLO DE VEREADORES 
Os desencontros na coordenação onde problemas (omissões, negligências...) de estrutura financeira de campanha e até de pouca confiança passada por seus líderes em reuniões, levaram a um "salve-se quem puder" entre grande parte dos candidatos a vereador dos situacionistas PSB, PT e PODEMOS. Nitidamente o pedido de convencimento de voto para a candidata a prefeita Izolda, foi deixado de lado. Comprovação dessa realidade é vista no resultado nas urnas dos candidatos do grupo de situação, pois a votação destes foi bem superior aos votos que a candidata Izolda teve refletindo até na composião dos eleitos: 10 (pró-Oscar) x 11 (pró-Izolda). Esses líderes, alguns vereadores de vários mandatos, não fizeram valer seus vínculos com a Prefeitura e sua força eleitoral, falhando ou omitindo o voto casado seu com o da sua postulante ao Executivo. 

Todos os amplos conhecedores da política sobralense acreditavam que - apesar dos percalços aqui elencados abaixo (fatores 1, 2, 3 e 5) - haveria a tradicional "cartada decisiva" dos  votos advindos dos distritos e localidades, os quais sempre foram o xeque-mate dos Ferreira Gomes sobre seus opositores competitivos junto ao eleitorado da cidade. Esperava-se uma maioria pró-Izolda de mais de 7.000 votos que revertesse as dificuldades nos redutos urbanos. Ao final e incluindo derrotas em distritos Aprazível, Torto, Bilheira, Patriarca e Taperuaba, Izolda e seu grupo só trouxeram dessas sessões minguados 970 votos de maioria. 

Mas por que o Blog acha, considerando os cenários já citados - esse fator o mais decisivo? Por que se tem ligação direta com as últimas semanas antes da eleição e o resultado final apertado na vitória da oposição com apenas 6.003 votos de maioria, ou seja, nitidamente com os possivelmente reversíveis 4,8% em ações mais incisivas nos redutos eleitorais dos vereadores situacionistas. 

Traições políticas sempre são alimentadas e não ocorrem por um único fator. Em conclusão, houve um erro crasso das lideranças e coordenadores na construção e reta final de campanha. 

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