O final de mandato sempre é uma provação para os governantes, em especial aqueles que sonham em se reeleger diante de situações delicadas. Para Jair Bolsonaro, o panorama é ainda mais desafiador. A oito meses das eleições, as suas agruras não param de crescer. Com um governo disfuncional que não tem realizações para apresentar e a economia em frangalhos, o presidente tem multiplicado as medidas populistas na tentativa de recuperar a popularidade perdida. Nos últimos dias, uma desastrada operação de relações públicas encenada para viralizar nas redes sociais atestou ao mesmo tempo o seu desespero e a falta de rumo da campanha.
Para enfrentar a maré de más notícias, o presidente improvisou um passeio por Brasília para gerar repercussão e imagens favoráveis. Foi filmado com a supervisão do filho Carlos Bolsonaro, mentor do gabinete do ódio e chefe de suas redes sociais (já designado para cumprir o mesmo papel na campanha). A photo opportunity trazia o presidente comendo frango e farofa com as mãos, uma encenação rapidamente compartilhada nas redes pelo assessor especial, tenente Mosart Aragão. O senador Flávio Bolsonaro tuitou: “Bolsonaro fazendo o que mais gosta. Falar com os brasileiros!”. A montagem era tão fingida e artificial que, ao invés de melhorar a imagem do presidente, teve o efeito contrário. Provocou uma enxurrada de críticas e virou uma crise.
Não foi o primeiro esforço do presidente em explorar sua imagem popularesca. Recentemente, ele se fez fotografar em um boteco no Guarujá. Também comeu pizza em uma calçada em Nova York, devorou pastéis em uma feira, frequentou uma barraca de cachorro-quente em Brasília e, no início do mandato, publicou foto preparando macarrão instantâneo no Japão. Tudo de acordo com o figurino de “povão” que garantiu sua eleição. A diferença é que agora o índice de rejeição disparou e, com a inflação em dois dígitos e o desemprego nas alturas, está cada vez mais difícil despertar o entusiasmo da população. Ao invés de surfar à vontade no circuito frango assado, coxinha, garapa e pingado, o presidente ouve críticas e desaforos, como aconteceu recentemente no cercadinho do Alvorada, quando uma estudante de 19 anos citou a Bíblia e o chamou de “farsa”.
Sua situação cada vez mais grave foi confirmada por pesquisa Ipespe que mostrou um cenário catastrófico nas eleições de outubro. Ele conseguiria apenas 24% dos votos e perderia para Lula (44%). No segundo turno, não conseguiria vencer nenhum dos principais concorrentes (Ciro Gomes, João Doria e Sergio Moro, além do próprio Lula). E sua rejeição é espantosa. Nada menos que 64% dos brasileiros afirmaram que não votariam nele de jeito nenhum. São dados demolidores. “Está cada vez mais na cara que as pesquisas são fraudadas”, martelou Bolsonaro novamente aos seus apoiadores, em estado de negação.
Essa arrogância tem se chocado cada vez mais com a realidade. Os apoios estão evaporando. Em pleno momento de consolidação da candidatura e articulação de apoios pelo País, Bolsonaro se vê cada vez mais sozinho. Aliados do Centrão, grupo que hoje é a sua principal base de sustentação, estão angustiados com as suas próprias pesquisas mostrando um cenário desolador, indicando que o presidente anda na contramão dos próprios eleitores. Segundo essas sondagens, a maioria dos que votaram nele é a favor das vacinas. Três quartos apoiam o passaporte da vacina. Por isso, os caciques do grupo fisiológico insistem que o presidente modere seus ataques à imunização, apelo que não surtiu efeito até o momento. E nem deve surtir, já que Bolsonaro depende do discurso negacionista para manter coesa a franja mais extremista dos seus seguidores.
O sinal de alerta acendeu inclusive no novo partido do mandatário, o PL. Pesquisa encomendada pelo seu presidente, Valdemar Costa Neto, mostra que o presidente tem 26,5% dos votos em São Paulo. É um nocaute para Bolsonaro, que depende eleitoralmente do estado, onde obteve 67,97% dos votos no segundo turno de 2018. O desastre faz os aliados questionarem se vale a pena caminhar com o presidente até o fim, já que sua candidatura parece irremediavelmente condenada.
É o caso do Republicanos, partido ligado à Igreja Universal, que chegou a ser inclusive sondado para abrigar o mandatário. Flávio Bolsonaro foi filiado à legenda e Carlos Bolsonaro ainda é. O Republicanos está no governo, controla o Ministério da Cidadania e tem diretorias em órgãos estratégicos como Conab e FNDE. Mesmo assim, abandonou o apoio à reeleição. Seus líderes se dividem atualmente na aposta a Lula ou a Sergio Moro. O Republicanos deve optar pela neutralidade, liberando os diretórios para escolherem seus candidatos a presidente. O PSC, do governador do Amazonas, Wilson Lima, deve adotar a mesma fórmula. E esse movimento está acontecendo também com o principal partido de apoio do presidente, o PP.
Ciro Nogueira, ministro da Casa Civil e presidente do PP, liberou as seções estaduais da legenda para que apoiem e cedam seus espaços de propaganda eleitoral aos candidatos que preferirem, inclusive adversários do presidente. Apesar de ter se comprometido em seguir os candidatos de Bolsonaro, o próprio partido do presidente, o PL, pode apoiar em São Paulo Rodrigo Garcia, o candidato de João Doria ao governo do estado. O PP e o Republicanos podem fazer o mesmo. Ou seja, a própria base governista ensaia abandonar o nome do presidente ao Palácio dos Bandeirantes, o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas. Pela situação delicada, os três partidos da base do governo também resistem em indicar um nome para a vice-presidência. Cotada para o posto, a ministra da Agricultura (atualmente no DEM) também refuta essa hipótese pelo mesmo motivo. Isso tem diminuído as opções que o presidente tem para montar sua chapa.
O sinal de alerta acendeu inclusive no novo partido do mandatário, o PL. Pesquisa encomendada pelo seu presidente, Valdemar Costa Neto, mostra que o presidente tem 26,5% dos votos em São Paulo. É um nocaute para Bolsonaro, que depende eleitoralmente do estado, onde obteve 67,97% dos votos no segundo turno de 2018. O desastre faz os aliados questionarem se vale a pena caminhar com o presidente até o fim, já que sua candidatura parece irremediavelmente condenada.
É o caso do Republicanos, partido ligado à Igreja Universal, que chegou a ser inclusive sondado para abrigar o mandatário. Flávio Bolsonaro foi filiado à legenda e Carlos Bolsonaro ainda é. O Republicanos está no governo, controla o Ministério da Cidadania e tem diretorias em órgãos estratégicos como Conab e FNDE. Mesmo assim, abandonou o apoio à reeleição. Seus líderes se dividem atualmente na aposta a Lula ou a Sergio Moro. O Republicanos deve optar pela neutralidade, liberando os diretórios para escolherem seus candidatos a presidente. O PSC, do governador do Amazonas, Wilson Lima, deve adotar a mesma fórmula. E esse movimento está acontecendo também com o principal partido de apoio do presidente, o PP.
Base aliada implode
A debandada se multiplica pelo País. Isso fica escancarado especialmente no Nordeste, onde Lula se beneficia com a rejeição do presidente. O esvaziamento da reeleição tem inclusive criado constrangimentos. O titular da pasta da Cidadania, João Roma, do Republicanos contava com o apoio do presidente para uma candidatura na Bahia contra seu ex-padrinho, ACM Neto (DEM, atual União Brasil). Corre o risco de naufragar junto com Bolsonaro. Na Paraíba, um aliado de primeira hora, o ex-prefeito de Campina Grande, Romero Rodrigues (PSD), desistiu de concorrer ao governo estadual por causa da alta rejeição do presidente. Pela mesma razão, governadores que eram aliados também sinalizam que não estarão no mesmo palanque do presidente: Romeu Zema (MG), Carlos Moisés (SC) e Ronaldo Caiado (GO).
A base está implodindo. O PTB, de Roberto Jefferson, estaria negociando sua fusão (ou venda) ao PL. São sinais do esfacelamento da coligação que sustentou o presidente até o momento. Quem ele queria que o apoiasse se afasta, já os antigos aliados que ele desejava deixar longe tentam desesperadamente usar seu nome, como o notório Fabrício Queiroz, que sonha em ser o “deputado mais votado” do Rio de Janeiro com o seu apoio — o que até agora não ocorreu. O ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, bateu de frente com o presidente ao forçar sua candidatura ao governo de São Paulo, rachando ainda mais o bolsonarismo no estado.
Os militares também começam a trabalhar com o cenário da derrota do chefe. O comandante da Força Aérea, brigadeiro Baptista Júnior, o nome mais próximo do bolsonarismo da cúpula das Forças Armadas, declarou que as tropas respeitarão qualquer presidente que vencer o pleito, inclusive Lula. Até um aliado de primeira hora, o procurador-geral da República, Augusto Aras, denunciou ao STF o ministro da Educação, Milton Ribeiro, pelo crime de homofobia. “Dividir é fácil. Destruir você é fácil. Duro é ajudar. Uma palavra destrói a pessoa, destrói reputação, acusações falsas. Gente que esteve do meu lado vários meses e, de repente… Muda, muda o disco”, queixou-se o presidente no cercadinho aos seus admiradores. Falava sobre Sergio Moro, mas na prática parecia um reconhecimento da consternação com o cenário atual.
Essa ruína acontece principalmente pela conduta do próprio presidente, que nunca se preocupou em respeitar a opinião pública. Nas enchentes históricas da Bahia, na virada do ano, ele perdeu muitos pontos ao se omitir. Agora, para fustigar seu adversário Doria, sobrevoou a região de enchentes em São Paulo. Mas fez isso condenando as próprias vítimas. Criticou os moradores de áreas de risco por “falta de visão de futuro”. Em outra bazófia, comemorou o acidente no metrô paulistano. “Semana que vem a gente conclui a transposição do São Francisco. Em São Paulo, eu vi a transposição do Tietê”, disse rindo.
Por sentir que o barco afunda, o presidente tem radicalizado sua retórica, comparando as eleições a “uma guerra”. Testa diferentes estratégias. A última foi radicalizar nas críticas a Lula, apesar de ter garantido a reabilitação do petista ao patrocinar o desmanche da Lava Jato. São ações desesperadas que não vão mudar o destino das eleições. Por isso, aumenta a especulação de que Bolsonaro pode desistir da reeleição e concorrer a um mandato de deputado ou senador para manter o foro privilegiado e escapar da Justiça a partir de 2023. O fato dessa hipótese circular cada vez mais dá a medida do medo crescente que acomete o mandatário. Nos meses finais do mandato ele deve se tornar um chefe sem autoridade. Para o Centrão, será o momento de aproveitar ao máximo o casamento de conveniências e as benesses do poder que desfrutaram de forma inédita. Para o presidente, não há escapatória. Não há operação farofa que possa reverter sua derrocada.
Fonte: ISTO É
Nenhum comentário:
Postar um comentário