Corte agora a cena para mais de três anos depois, na última quarta-feira, 10. Ao lado do agora presidente Bolsonaro, o líder nacional do PL, o polêmico — e condenado pelo Mensalão — ex-deputado Valdemar Costa Neto, anuncia a filiação do antigo crítico ao partido no próximo dia 22. Mais de dois anos após romper com o PSL, Bolsonaro procura agora no mesmo Centrão a construção de uma candidatura com maior viabilidade para disputar pela reeleição em 2022.
"Muita gente diz 'Ah, o Centrão'. Votaram em um cara do Centrão", disse o presidente na última semana, enquanto apontava para si mesmo. Além do próprio PL, Bolsonaro tenta atrair outros partidos do emblemático bloco de siglas de centro, conhecido pela pouca consistência ideológica e pelo "toma lá, dá cá" que o levou a apoiar, em horas distintas, Lula (PT), Dilma Rousseff (PT), Temer (MDB) e agora Bolsonaro.
"O presidente não tem nenhuma relação com partidos políticos. Para ele, o partido é uma mera exigência para que ele possa concorrer a cargo eletivo", destaca o cientista político Rodrigo Prando, professor da Mackenzie, explicando razões do atual movimento migratório do chefe do Planalto. "Ele nunca foi alguém que teve uma ligação orgânica, de valores ou de ideologia a partidos", avalia.
Neste mesmo sentido, o cientista político Cleyton Monte, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), destaca contornos de estratégia eleitoral na evolução do "namoro" de Bolsonaro com o Centrão. "A demora na filiação veio justamente porque o presidente tentou encontrar um arranjo que pudesse torná-lo competitivo para o ano que vem", diz.
"Já existe a compreensão de que a eleição do ano que vem não vai ser no mesmo formato que foi em 2018, e que ela vai exigir uma boa estrutura de campanha, tempo de TV, Fundo Eleitoral e capilaridade nos interiores. Nesse momento, o Bolsonaro só encontra isso nos partidos do Centrão. E entra aí essa busca do Planalto por uma coalizão, com PL, PP, PTB, Patriota, esses partidos que hoje são ligados ao governo, que já votam com ele", continua.
Marcada para a segunda-feira da semana que vem, 22, a filiação de Bolsonaro no PL ocorre após o presidente deixar o PSL em novembro de 2019, pouco mais de um ano após ser eleito pelo partido. Desde então, o presidente tentou fundar a própria sigla, o Aliança Pelo Brasil, mas, diante de dificuldades em obter as assinaturas necessárias, passou a negociar com diversas siglas do Centrão. Este será o nono partido do presidente
A mudança promete trazer profundas alterações no cenário político do Brasil: atualmente, o PL já é o terceiro maior partido da Câmara dos Deputados, com 43 parlamentares. A filiação do presidente, no entanto, deverá promover verdadeira migração em massa para dentro e para fora do partido, incluindo adesão de bolsonaristas "puro sangue" como o próprio filho do presidente, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).
O clima no partido, no entanto, está longe de ser unânime pela candidatura de Bolsonaro. Logo após o anúncio da filiação, o próprio vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), classificou a chegada do clã bolsonarista como "incômoda" e declarou que não apoiará a reeleição do chefe do Planalto em 2022. Outros deputados, especialmente da Região Nordeste, já avaliam deixar o partido após a filiação de Bolsonaro.
Para especialistas, a mudança do presidente irá parar no "arsenal" de adversários de Bolsonaro. "Ele ganhou em 2018 muito na onda da antipolítica, da força da Lava Jato e desse ataque à corrupção. Agora, ele vai ter que remodelar esse discurso, porque usar ele estando no bojo do partido do Valdemar Costa Neto, o telhado fica de vidro. Apenas os mais fanáticos, os já convertidos, iriam acreditar", destaca Prando.
"Não sei se a contradição afeta na prática o núcleo duro do bolsonarismo, porque já foram tantas contradições, quando o presidente disse que não ia ter toma lá, dá cá, quando disse que não ia ter diálogo com o Centrão. Enfim, ele foi e voltou tantas vezes que é difícil acreditar que isso vá prejudicar ele no voto de nicho. Agora, vai ser mais difícil tentar se vender como uma novidade", corrobora Cleyton.
Fonte: O Povo
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