O tom da discussão foi dado pelo secretário estadual de Desenvolvimento Agrário, Francisco de Assis Diniz, num evento do PT em Crateús: “Ao lado do [Jair] Bolsonaro tem uns patifes, como o senhor Ciro Ferreira Gomes, que não tem moral. O Ciro, na lama onde está, quer nos arrastar para dentro dessa lama. Ele não vai conseguir fazer isso, porque nós caminhamos para voltar a governar este país.”
Assis Diniz, um ex-sindicalista metalúrgico que ajudou a fundar a Central Única de Trabalhadores e presidiu o PT cearense, apenas reflete a posição de Lula, que está empenhado em levar o partido a romper a aliança com o PDT de Ciro Gomes.
Lula acha que o PT tem força suficiente para disputar o governo estadual com o PDT. Animou os deputados federais José Airton Cirilo e Luizianne Lins com a ideia de uma “chapa pura”. Cirilo tentou se eleger governador por duas vezes (em 1998 e 2002), e perdeu. Luizianne se elegeu prefeita de Fortaleza (2004) contra a vontade expressa de Lula do então chefe da Casa Civil, José Dirceu. Às vésperas do primeiro turno, Dirceu foi a Fortaleza demonstrar “solidariedade” ao adversário de Lins, o candidato do PCdoB Inácio Arruda.
Esse evento entrou para a história do partido, porque terminou com a divulgação de uma carta pública do PT renegando a própria candidata. Ela venceu, ficou oito anos na prefeitura, tentou voltar (em 2016) mas estacionou no terceiro lugar, com 15% dos votos.
Os deputados Luizianne e Cirilo e o secretário estadual Assis Diniz racharam o PT cearense, atraídos pela ideia de compor uma chapa abençoada por Lula.
No lado oposto está outro deputado, José Guimarães, personagem-chave na coalizão comandada pelo petista Camilo Santana.
Na divisão do governo com o PDT, Guimarães ficou com boa parte das secretarias destinadas ao PT. Santana cumpre o segundo mandato e planeja se eleger na única vaga disponível para o Senado em 2022. Ambos não querem rompimento. Ao contrário, até planejam fortalecer os laços com o PDT no Estado.
Para Lula, a longa aliança com o PDT cearense passou a ser um fator de incômodo. No Estado, ele detém folgada liderança, segundo pesquisas, com média de 20 pontos percentuais à frente de Bolsonaro e a dianteira do ex-governador Ciro Gomes.
A alternativa, propôs, seria uma composição com o MDB de Eunício Oliveira, ex-presidente do Senado, cuja batalha particular com Ciro Gomes se espraia pelas páginas de quatro dezenas de processos judiciais. Eunício tem um plano de vôo autônomo para 2022: se eleger deputado e, em fevereiro de 2023, disputar a presidência da Câmara.
O problema de Lula está na lâmina retórica que Ciro Gomes exibe como peça de campanha, com a ajuda do publicitário João Santana, cuja biografia atravessa a intimidade dos quase treze anos do PT no poder.
O ex-governador do Ceará, quase diariamente, debita a eleição de Bolsonaro, em 2018, na conta da “corrupção do governo Lula” e da “incompetência do governo Dilma”, e “alerta para o risco que seria a a reincidência no erro de Lula”.
Em outros tempos, o chefe do PT ordenaria e os petistas cearenses imediatamente obedeceriam. Romperiam a aliança em retaliação, para reduzir o ímpeto do adversário luta pela presidência. Mas a confusão em Fortaleza indica que algo mudou, para Lula e seu partido.
A dificuldade de Lula, hoje, é que a maioria dos parlamentares petistas aprendeu a não depender da sua permanente candidatura presidencial para conseguir sobreviver nas urnas. E, no Ceará, muitos acham que ainda precisam da aliança com o PDT de Ciro Gomes para se manter no poder local, qualquer que seja o resultado da disputa nacional no próximo ano.
José Casado - Colunista de Veja.com
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